A evolução da tecnologia tem permitido a abundância de alimentos nos países mais desenvolvidos, mas o uso desequilibrado dos recursos naturais contribui para o aumento da pegada ecológica, promovendo cadeias longas de fornecimento de produtos agroalimentares, que se tornam ameaçadas perante crises pandémicas e/ou militares, mostrando a fragilidade da autonomia e sustentabilidade agroalimentar do país. O fomento do conhecimento dos produtos endógenos e das suas características por parte dos consumidores e pequenos produtores levará ao estímulo do comércio de proximidade, de produtos sazonais e de benefícios para a saúde, para além do contributo que poderá dar para a auto-suficiência alimentar do país. Estes produtos são catalisadores de circuitos curtos de comercialização e do desenvolvimento de comunidades rurais, contribuindo assim para a coesão territorial e sustentabilidade agroalimentar do país. 

O conhecimento científico sobre alimentos endógenos é limitado, baseando-se essencialmente nos saberes empíricos transmitidos geracionalmente como garantia da sua qualidade, em produções reduzidas e muitas vezes longe das tendências atuais de mercado. O estabelecimento das bases científicas que afiram a qualidade e a compatibilização dos produtos entre si poderá viabilizar a aproximação do consumidor ao produtor através de circuitos curtos, com produção sustentável de alimentos com história, sazonais, nutritivos e benéficos para a saúde. Esta é uma das metas do Pacto Ecológico Europeu e dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). A acessibilidade e comunicação do conhecimento científico sobre alimentos saudáveis à população, incluindo os próprios produtores, é, em geral, ainda deficitária em Portugal. A consciencialização alimentar tem levado à procura informada de alimentos sustentáveis e mais saudáveis. Os avanços do conhecimento científico permitem combinações de alimentos para uma nutrição mais saudável e equilibrada, ambientalmente enquadrada e com desperdício zero.

Portugal apresenta um conjunto de produtos endógenos, cujas produções têm vindo a ser abandonadas em alguns territórios, ou vocacionados para uma produção residual, que nem chegam ao conhecimento dos consumidores. Para um equilíbrio da coesão territorial importa recuperar, preservar e dar a conhecer esta biodiversidade. Ao mesmo tempo, é necessário colmatar uma lacuna no mercado no que se refere à rastreabilidade dos produtos endógenos, capacitando as PME do retalho com mecanismos digitais que fomentem a informação do consumidor sobre a origem desses produtos. 

O consumo elevado de produtos de origem animal acarreta um forte impacto na saúde e ambiente, pelo que é importante diversificar as fontes de proteína e o recentramento dos hábitos alimentares quotidianos dos Portugueses na Dieta Mediterrânica. De acordo com os princípios da Dieta Mediterrânea, a orientação para o consumo de fontes de proteína vegetal, aproveitando a diversidade de variedades de cereais, leguminosas, hortícolas, frutos e as propriedades benéficas para a saúde e bem-estar de ervas aromáticas como substitutos de sal e conservantes, azeite como principal fonte de gordura insaturada, poderão ser agrupados numa oferta com o simbolismo de um cabaz.

O projeto PorCabaz é uma oportunidade para uma reinterpretação e qualificação dos produtos endógenos produzidos localmente respeitando a época de produção, fomentando circuitos curtos e respondendo às novas solicitações do mercado.

O consumo de produtos regionais associado a práticas de alimentação saudável como prevenção de doenças predominantemente de origem alimentar (Proposta_Cabaz_Alimentos_BA.pdf, min-saude.pt) têm vindo a ser adotados e consolidados na sociedade Portuguesa. Nesta linha, o Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável (PNPAS) lançou um conjunto de receitas distribuídas juntamente com um cabaz de alimentos tendo por base as porções alimentares propostas pela Roda dos Alimentos. As suas metas visam o controlo da obesidade, a redução da quantidade de sal, de açúcar e de ácidos gordos trans nos alimentos, assim como o aumento do consumo de produtos frutícolas e hortícolas, que são a base da Dieta Mediterrânica.

O projeto PorCabaz visa contribuir para as metas definidas pelo PNPAS através do fomento do consumo informado, mais alargado e diversificado de produtos endógenos com reconhecimento local, que permitam a sua valorização integrada e sejam garantia de autenticidade e qualidade, aproximando produtores e consumidores. A avaliação destes alimentos do ponto de vista nutricional, bioquímico e organolético é pedra angular para determinar o seu potencial de valorização e transformação com vista ao desenvolvimento de produtos que respeitem os padrões da Dieta Mediterrânica.

De acordo com as características e qualidades nutricionais dos produtos endógenos Portugueses, o projeto PorCabaz irá desencadear o conhecimento científico e as ferramentas tecnológicas e culturais facilitadoras da sua promoção. A compatibilização nutricional, organolética, de tendências de mercado, sazonalidade e oportunidade, responde às expectativas de produtores e consumidores.

O projeto PorCabaz integra os produtores de variedades tradicionais e endógenas, enquadrando os seus produtos como casos de estudo dos diferentes grupos da roda da alimentação mediterrânica. Cada produto terá um código QR com informação, para o produtor e consumidor, da sua história, espécie, nomes comuns e regionais, uso tradicional, produtor e produção, método de cultivo, valor nutricional, características bioquímicas em fresco e confeccionado, potenciais benefícios para a saúde, as quantidades recomendadas e sua rastreabilidade. Receitas gastronómicas simples aproximam consumidor e produtor, promovendo o aumento informado do comércio local de produtos endógenos, contribuindo para a implementação de hábitos alimentares saudáveis e sustentáveis em que o desperdício é minimizado pela utilização na totalidade das diferentes partes dos alimentos.

A interação de produtores, equipas de investigação, grupos de ação local e centros de competências permitirá complementar a produção essencialmente primária com a dinamização dos mercados em circuitos curtos que valorizam qualidade e especificidade. A colaboração de chefes cozinheiros de renome internacional, com o apoio de um Centro de Formação Profissional, permitirá reinterpretar a confeção de produtos endógenos e elaborar ementas-piloto para cantinas escolares e fabris.

Partindo de um conjunto representativo de produtos e produtores, associados numa comunidade inclusiva e aberta a parceiros societais, o projeto PorCabaz capacitará os produtores com ferramentas que permitam a elaboração de cabazes de acordo com a disponibilidade e complementaridades dos produtos endógenos. O estudo piloto proposto criará as bases para a sua replicação de modo a qualificar os produtos endógenos portugueses e valorizar a sua diversidade, em sintonia com os desafios lançados pelo PNPAS.